“Um estudo frágil. Com 36 pessoas e que foi usado para mover fanatismo na ciência na pandemia. Foi, agora, retratado. Isto é, despublicado. Não há, talvez, maior vergonha na ciência que ser apagado de uma publicação. O autor sofreu ainda uma sanção para o exercício da medicina. O que aprendemos com esse caso? Ciência é prática séria e que exige rigor. Exige verdade no método e na apresentação dos resultados. Quando se mistura à prática ideológica de manipulação política é desastroso”. Assim se posicionou a antropóloga Debora Diniz (@debora_d_diniz) sobre o descarte oficial das teses sobre a eficácia da cloroquina e da hidroxicloroquina no tratamento do Covid-19.
INEFICÁCIA REAFIRMADA
Ontem, a RFI (Rádio França Internacional) publicou: “Após mais de quatro anos de polêmica, o estudo assinado pelo infectologista francês Didier Raoult sobre o uso da cloroquina e da hidroxicloroquina, que fundamentou a indicação deste medicamento contra a Covid-19, foi invalidado pelo editor da revista científica [Journal of Antimicrobial Agents] que o publicou”. Há três anos, em 3/12/2021, a RFI noticiava: “O médico e professor francês Didier Raoult, que ficou mundialmente conhecido como ‘Dr. Cloroquina’, foi alvo de uma sanção disciplinar da Ordem de Medicina. A instituição, que ameaçou banir o profissional, considera que ele infringiu o Código de Ética Médica ao promover o uso da hidroxicloroquina no tratamento contra a Covid-19, apesar de a eficácia do medicamento contra o coronavírus nunca ter sido provado”. No Brasil, as evidências do erro no uso desses medicamentos contra o Coronavírus, não só foram ignoradas pelo governo, como então presidente, o ex-capitão Jair Messias, usou desbragadamente a fake news sobre a eficácia desses medicamentos como bandeira política/ideológica. Esse receituário bolsonarista, associado ao combate aberto ao uso de máscaras e outras recomendações preventivas, marcou a vanguarda do negacionismo e catapultou o Brasil para a liderança mundial de mortes em decorrência da pandemia.
AÇÃO CRIMINOSA
Apesar das fortes contestações científicas, públicas, desde 2020, sobre a eficácia de cloroquina e ivermectina contra o Covid-19 (eficientes para seus usos tradicionais contra malária e verminoses), o governo federal bolsonarista ignorou as denúncias e acelerou no seu uso. Como lembrou o Jornal Opção, ontem, “entre março de 2020 e janeiro de 2021, houve ao menos quatro medidas federais promovendo diretamente ou facilitando a prescrição do medicamento”. A reportagem destaca medidas como “um protocolo do Ministério da Saúde de 20 de maio de 2020, recomendando o uso da cloroquina em todos os casos de Covid-19, e o aplicativo TrateCov, também do ministério, que sugeria a médicos a prescrição de drogas como hidroxicloroquina, cloroquina, ivermectina e azitromicina, tirado do ar pouco depois”. Em 25/05/2021, a CNN noticiava: “a produção de compridos de cloroquina pelo Laboratório Químico Farmacêutico do Exército (LQFEX) em 2020 foi multiplicada por mais de 12 vezes e passou de 3,2 milhões de comprimidos, quando teve início a pandemia da Covid-19, ante menos de 260 mil unidades fabricadas em 2017”. Um golpe, de grande letalidade, foi praticado durante a pandemia de Covid-19 no Brasil, matando aproximadamente 1,8 milhão de pessoas entre 2020 e 2021 – e isso não pode ser despublicado, infelizmente. Mas não pode nem deve ser esquecido, muito menos jair anistiando os envolvidos nesse genocídio.
Diante de tudo isso, será que restam dúvidas sobre a responsabilidade civil e criminal do então chefe de governo brasileiro no tamanho da tragédia desabada sobre nosso povo?