Doença de Chagas: complicação no esôfago pode ser genética, diz estudo

Pesquisadores brasileiros identificaram que variante genética está relacionada a distúrbios no esôfago de pacientes com doença de Chagas.

Uma pesquisa liderada por cientistas brasileiros identificou que uma mutação genética pode estar relacionada a distúrbios em pacientes com megaesôfago chagático. A condição é causada pela doença de Chagas e provoca o aumento do esôfago. Para os pesquisadores, as conclusões do levantamento podem inspirar novos tratamentos para pessoas com a condição.

As observações sugerem que, em portadores dessas mutações, o aumento da produção de um mediador inflamatório conhecido como IFN-gama leva à disfunção das mitocôndrias (responsáveis por gerar energia) nos neurônios.

A degeneração dos neurônios presentes na parede do esôfago contribuiria, portanto, para o desenvolvimento do megaesôfago ligado à doença de Chagas. A alteração na mitocôndria foi encontrada em 18% dos pacientes portadores de cardiopatia chagásica crônica, mas somente em 2% da população brasileira em geral.

“Após anos de pesquisa, conseguimos entender melhor esse mecanismo da disfunção mitocondrial induzida pelo IFN-gama. A importância desse achado é justamente o fato de podermos buscar drogas específicas para diminuir essa alteração”, explica o professor Edecio Cunha-Neto, da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP) e um dos autores do artigo, à Agência Fapesp.

Problema no coração

O especialista, que também é pesquisador do Instituto do Coração (InCor), conta que a presença de alteração inflamatória já havia sido demonstrada em pacientes com cardiomiopatia, complicação no coração que também está relacionada à doença de Chagas.

Os pesquisadores analisaram material retirado do órgão de pacientes com Chagas submetidos a transplante cardíaco. Em seguida, eles observaram a existência de distúrbio no metabolismo energético do órgão — havia redução de um grande número de proteínas e enzimas ligadas à produção de ATP, que é a principal forma de energia química da célula.

Por meio de várias análises, foi possível demonstrar que os níveis elevados de IFN-gama em pacientes com cardiomiopatia provocada por doença de Chagas reduzem o metabolismo energético da célula, levando à disfunção mitocondrial no tecido cardíaco.

“Tratando essas células do músculo cardíaco com IFN-gama, conseguimos ver que havia diminuição da produção de ATP. Então, trabalhamos com a hipótese de que o IFN-gama pudesse agir também em outras formas sintomáticas da doença, reduzindo a função mitocondrial. Passamos a estudar casos de megaesôfago”, acrescenta Cunha-Neto.

Pesquisa atual

Na pesquisa publicada agora, o grupo fez o sequenciamento de parte dos genes de 13 pacientes com megaesôfago provocado por doença de Chagas. Dos indivíduos com problemas digestivos, cerca de 40% apresentaram a mesma variante mitocondrial.

Por meio de amostras de sangue dos pacientes, foram isoladas células capazes de se multiplicar indefinidamente com exatamente a constituição genética do paciente. Os cientistas usaram essas células com e sem mutação para avaliar o efeito do IFN-gama sobre a função mitocondrial.

O resultado foi que os pacientes com a mutação mitocondrial produziram menos ATP na presença de IFN-gama do que as células dos pacientes que não tinham a mutação.

Entre as substâncias que podem vir a ser usadas para tratar o megaesôfago e a cardiomiopatia estão a metformina, remédio oral contra diabetes, e o resveratrol, presente em plantas com efeito antioxidante. Ambas foram capazes de mitigar a disfunção mitocondrial induzida pelo IFN-gama nas células do coração.

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