Mulheres são mais vulneráveis a ter problemas no coração. Entenda

Fatores hormonais e socioeconômicos contribuem para doenças do coração ao longo da vida, distanciando-as dos homens nas estatísticas.

As doenças cardiovasculares correspondem a um terço das mortes por todas as causas no mundo. Fatores de risco como obesidade, diabetes e tabagismo são conhecidos por afetar homens e mulheres, mas elas correm um risco adicional por causas específicas ao gênero feminino: a principal delas é a variação hormonal ao longo da vida, desde a menarca até a menopausa.

“Nós morremos mais do que os homens e nossos fatores de risco são outros. As mulheres são diferentes umas das outras e vão se transformando durante toda a vida. Tudo depende de quando ela passa pela menarca, quando é exposta aos hormônios progesterona e estrogênio, quando fica grávida e como passa pela menopausa”, afirma a médica cardiologista Gláucia Maria Moraes De Oliveira, diretora da Sociedade Brasileira de Cardiologia (SBC) e professora da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

A prevalência de doenças cardiovasculares teve um aumento entre jovens de 15 a 49 anos de ambos os sexos nos últimos 30 anos, segundo dados da SBC. O percentual dos óbitos por acidente vascular cerebral (AVC), em contrapartida, foi maior entre as mulheres.

A fim de alertar pacientes e médicos, a Sociedade Brasileira de Cardiologia lançou, nessa quinta-feira (13/10), durante o 77º Congresso Brasileiro de Cardiologia, o Posicionamento sobre a Saúde Cardiovascular nas Mulheres. No documento, a entidade pede que sejam feitos esforços para que a meta de 30% de redução na taxa de mortalidade feminina seja alcançada até 2030.

Mortalidade

Dados do estudo Global Burden of Disease Study 2019 mostram que houve uma redução mundial da taxa de mortalidade por doença cardiovascular nas últimas décadas, com tendência a estagnação nos últimos anos. Entre as mulheres com faixa etária de 35 a 54 anos, por outro lado, foi observado um crescente aumento de óbitos por doença isquêmica do coração (DIC) nos Estados Unidos, dado atribuído à maior prevalência dos fatores de risco cardiovasculares tradicionais, como obesidade, diabetes e tabagismo.

Para as brasileiras, o ranking de taxas de mortalidade e de anos de vida ajustado pelo indicador que representa a perda do equivalente a um ano de saúde por doenças cardiovasculares definiu alguns fatores de risco para desenvolver as condições. Aparecem na lista: elevação da pressão arterial sistólica, IMC elevado, riscos alimentares, colesterol LDL elevado, tabagismo e glicemia de jejum elevada. Houve também o aumento da prevalência de doenças cardiovasculares nas mulheres jovens de 15 a 49 anos.

“A doença cardiovascular afeta principalmente quem é pobre e negro. As mulheres negras morrem muito mais, são mais hipertensas e têm mais de complicações da gravidez. A vulnerabilidade social mostra a desigualdade em uma mesma população e isso está diretamente relacionado com as doenças cardiovasculares”, afirma Gláucia.

Atualmente, a doença isquêmica do coração é responsável pela maioria das mortes em todas as unidades da federação do Brasil, seguida pelas doenças cerebrovasculares.

Fatores de risco

Os fatores de risco tradicionais para doenças cardiovasculares são hipertensão arterial, dislipidemia (gordura no sangue), diabetes, sobrepeso e obesidade, síndrome metabólica, dieta não saudável, sedentarismo, tabagismo e doença renal crônica.

Nas mulheres, especificamente, destacam-se o quão cedo foi a menarca, a síndrome dos ovários policísticosdiabetes gestacional, distúrbios hipertensivos da gravidez, parto prematuro, recém-nascido com baixo peso, inflamação sistêmica, doenças autoimunes, terapia hormonal e menopausa prematura.

Segundo Gláucia, que é uma das autoras do documento da SBC, tanto o estrogênio quanto a progesterona atuam de formas diferentes nos diversos tecidos. “A mulher é mais afetada por causa do estrogênio com o aparecimento da gordura visceral. O homem tem naturalmente mais massa muscular e, por causa dela, emagrece com maior facilidade”, afirma a cardiologista.

Durante a gravidez, a mulher ainda pode ter diabetes e hipertensão, duas condições que aumentam o risco cardiovascular pós-parto, persistente pelo resto da vida. “A paciente que desenvolve diabetes gestacional pode ter sete vezes mais risco de ter diabetes no futuro. O quarto trimestre da gestação é fundamental porque todas essas doenças podem se manifestar, como a miocardiopatia periparto – dilatação do coração –, por exemplo”, afirma.

Existem ainda os fatores de risco pouco reconhecidos incluídos no documento da SBC, mas que têm impacto direto na saúde do coração, como a depressão, ansiedade e estresse crônico, abuso sexual e violência, privação socioeconômica, baixa educação em saúde, fatores de risco ambientais, discriminação racial, dificuldade de acesso aos sistemas de saúde, orientação sexual e tratamento oncológico.

Esses fatores levam à inflamação, disfunção endotelial, aterosclerose subclínica, e disfunção autonômica e imune, que podem culminar no aparecimento de doenças cardiovasculares como infarto do miocárdio, acidente vascular cerebral (AVC), insuficiência cardíaca, morte súbita cardíaca, fibrilação atrial e demência, por exemplo.

*A repórter Bethânia Nunes está no Rio de Janeiro a convite do grupo farmacêutico Novartis para acompanhar o 77º Congresso Brasileiro de Cardiologia.

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