
Primeiro de janeiro é um desses dias que confirmam e relembram coisas extraordinárias, como o poder do Império Romano e sua força tremenda para a chamada Cultura Ocidental. Pois essa data é referência “global” para muito além da península (hoje) italiana, pelo menos, desde 135 a.C., quando os cônsules romanos eram empossados em seus cargos.
Em 45 a.C., ou há 2.069 anos, o Calendário Juliano entrou em vigor oficializando o primeiro dia do mês de janeiro como a data de início do ano. Três anos depois, em 1º de janeiro de 42 a.C., o Senado Romano decreta como deus o finado Júlio César – assassinado por senadores no próprio senado nos idos de março do ano 44 a.C.
Para quem gosta de filmes e de história, é hora de lembrar que no dia 1º de janeiro do ano 193, o Senado Romano escolhe um militar e professor de gramática chamado Pertinax para suceder como imperador Romano o famigerado Cômodo, assassinado na virada de ano. Cômodo virou celebridade contemporânea (maligna) graças ao filme O Gladiador, de Ridley Scott, em papel desempenhado por Joaquim Phoenix.
No período de ascensão do Cristianismo como religião dominante no Império Romano, em 1º de janeiro de 404, o imperador (cristão) Honório determina o final das lutas entre gladiadores em todo império, em lembrança do dia 1º de janeiro de 391, quando um monge cristão – chamado Telêmaco – foi apedrejado até a morte pelos torcedores desse “esporte” por tentar impedir um combate entre gladiadores num anfiteatro em Roma.
Ainda na seara do Cristianismo, desde que essa crença se tornou poderosa e incorporou o 25 de dezembro – momento sagrado para as crenças pagãs – como suposto dia de nascimento de Jesus (data inexistente na Bíblia), resultou em que, oito dias depois, pelas regras da Torá, é o dia da circuncisão para qualquer judeu. Bingo! O 1º de janeiro, na virada do ano no calendário de Júlio César, virou o Dia da Circuncisão do Senhor, mas – ao longo do tempo – a própria igreja católica foi deixando de lado essa referência ululantemente judaizante.
Dando um pulo no calendário e trazendo o foco para o Brasil, deve-se assinalar que primeiro de janeiro é instituído como o Dia da Fraternidade Universal pelo então presidente Getúlio Vargas, em 1935, copiando o que os lusitanos fizeram em 1910, quando da Proclamação da República Portuguesa – que, por sua vez, privilegiando um calendário de feriados laicos, descredenciou o 1º de janeiro como o dia que o Salvador perdeu o prepúcio e ressignificou a data como “Dia da Fraternidade Universal”.
em 1967, Paulo VI, então sumo pontífice católico, institui, em ato assinado no dia 8 de dezembro, o 1º de janeiro como Dia Mundial da Paz, propondo a extensão dessa data comemorativa para todo o planeta, independente do credo religioso, como momento de “caráter sincero e forte de uma humanidade consciente e liberta dos seus tristes e fatais conflitos bélicos, que quer dar à história do mundo um devir mais feliz, ordenado e civil”.
Em 1º de janeiro de 1968 é comemorado o primeiro Dia Mundial da Paz, tempo marcado por guerras cruéis como a patrocinada pelos Estados Unidos contra o Vietnã. E escreveu Giovanni Montini (Papa Paulo VI): “A proposta de dedicar à paz o primeiro dia do novo ano não tem a pretensão de ser qualificada como exclusivamente nossa, religiosa ou católica. Antes, seria para desejar que ela encontrasse a adesão de todos os verdadeiros amigos da paz”.
Em 2024, tempo marcado por uma guerra genocida como a patrocinada por Israel contra o povo palestino, além das guerras travadas atualmente na Ucrânia, Burkina Faso, Somália, Sudão, Iêmen, Mianmar, Nigéria e Síria, resta clamar para que o chamamento, o apelo, o berro pela Paz – expresso adequadamente e/ou ilusoriamente há tantas décadas – seja um dia tornado realidade, e o mundo possa ter, enfim, um ano verdadeiramente novo, pois não existe nada mais velho, ruim e repetitivo que a guerra.
Feliz ano novo, (e sempre) viva a Paz!